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A História Do Agribusiness No Brasil E No Mundo

O termo “Agribusiness” é relativamente novo, não existindo nos dicionários mais antigos. O livro contando a história do Agribusiness brasileiro foi editado em 2002 pela ABAG (Associação Brasileira de Agribusiness), 236 páginas, tendo como autor o jornalista Rogério Furtado, Editora Evoluir Cultural-SP, com a apresentação do Ministro da Agricultura, Dr. Roberto Rodrigues que inicia com o sub-titulo: A pílula de alimento concentrado, essa continuará em falta. Pela importância do livro, vamos reproduzir parte da apresentação, inclusive o índice com os títulos dos capítulos e subtítulos dos assuntos, para despertar o interesse pela obra, que é atual, e precisa ser lido pelos interessados em adquirir conhecimento da nossa economia agrícola, industrial e comercial, desde a descoberta do Brasil até os dias atuais. Transcrevemos a seguir:

APRESENTAÇÃO- Pílula de alimento concentrado, essa continuará em falta. Luis da Câmara Cascudo inicia sua “História da Alimentação no Brasil” com três frases. A primeira, da Bíblia, fica no alto da página: “Todo trabalho do homem é para sua boca” Eclesiastes VI,7). A segunda, é de Schiller: “A fome e o amor governam o mundo”. A terceira frase é do próprio Cascudo: “Toda a existência humana decorre do binômio estômago e sexo”. Talvez, pela crueza, a frase tenha exigido vir ao mundo amparada por uma citação bíblica e, outra, de um poeta. Cascudo era sábio. Temperada dessa maneira, a verdade não chega a ferir os espíritos mais suscetíveis.

Nós, da ABAC, consideramos o mestre Cascudo um aliado. Afinal, os alimentos são o nosso grande negócio, ainda que não sejam o único. Mas, neste livro não iremos abordar assuntos relativos ao amor, ainda que eles sejam apaixonantes. Cascudo também evitou esse tema na “História da Alimentação”.

Estaremos mais perto do estômago e da pele humanas, tangenciando nosso imaginário e ambições. Sem o imaginário, as ambições e, por que não, a vaidade, grupos de homens teriam se lançado à empreitada da conquista das Índias e da América? Pois foi com esses sentimentos que eles deixaram a Europa para inaugurar a nossa História. Aqui, acompanhando o exemplo de Cascudo quando ele tratou daquilo que é básico para a existência humana, a franqueza é bem-vinda. De um lado, o heroísmo dos conquistadores ibéricos merece nossa admiração. No reverso da medalha há a violência da conquista e do escravismo. Fora o desperdício de vidas, houve o desperdício de recursos naturais. Justamente por isso devemos permanecer sempre atentos para evitar os erros do passado. Caso contrário, o estudo da História não faria sentido.

A História – seja de um país, de uma cidade, de uma região – sempre poderá ser reescrita, desde que surjam documentos ou dados inéditos para realçar fatos cujos contornos sejam indistintos. Ou para trazer novidades capazes de mudar o entendimento de determinada época. De vez em quando, tais novidades podem exigir uma revisão profunda da História. O que interessa à ABAG não é mudar a História, mas salientar o papel fundamental da agropecuária e, depois, do Agronegócio na formação do Brasil. Por agronegócio devemos entender, de maneira simplificada, o encadeamento dos laços econômicos da agropecuária com seus fornecedores, clientes e o consumidor final. Portanto, o agribusiness é bem maior que a produção rural considerada isoladamente. Na realidade, é o maior negócio do país que, coincidentemente, acabou sendo o único a ter nome de árvore”.

“Brazili era uma das denominações da madeira tintorial trazida para a Europa na Idade Média, pelos árabes, que iam buscá-la no Oriente. Surgiu na Itália, séculos antes da viagem de Pedro Álvares Cabral, numa fase em que o renascimento do comércio começava a despertar uma Europa entorpecida pelo feudalismo. Feito isso, seguiram-se quase mil anos de evolução contínua em direção ao mundo no qual nos encontramos hoje. Mais ou menos na metade desse trajeto é que os portugueses acostaram no Brasil. De l500 até l960, mais ou menos, fora o ciclo do ouro e das pedras preciosas, os produtos agropecuários dominaram a vida econômica do país. Para o consumo e, principalmente para a exportação. Os que se destacam foram a cana de açúcar, os couros, o fumo, o cacau, a borracha e o café.

A partir de 1970, houve a “explosão” da soja, revolucionando o campo e abrindo fronteiras. Essa tarefa de ocupar terras no interior do país durante muito tempo fora exclusividade reservada ao boi. A soja não caminhou sozinha. Acabou puxando outros cultivos e tem sido uma das matérias-primas essenciais na alimentação de frangos e suínos nas granjas especializadas. Durante o processo acelerado de modernização, iniciado na segunda metade do século passado e ainda não concluído, a agropecuária incorporou muita tecnologia. Na verdade, as atividades rurais constituíram a base sobre a qual foi erguido o complexo agroindustrial, que é o maior gerador de divisas com que pode contar o Brasil.

Hoje, a agricultura se faz com muita pesquisa, muito trabalho e com o uso intensivo das tecnologias mais modernas, incluindo satélites e informática. A roça deixou de ser, faz tempo, um lugar habitado exclusivamente pelo atraso. E quando alguém comenta a respeito da roça, em tom depreciativo, está cometendo um erro. No mínimo, é preciso esclarecer a que roça está se referindo. Determinadas áreas de produção no Brasil são tão ou mais produtivas que as regiões da agropecuária de ponta do primeiro mundo que, aliás, só é desenvolvido porque tem uma agropecuária desenvolvida.

Aqui já estamos acostumados a incorporar à nossa rotina, ao mesmo tempo que os produtores estrangeiros, não apenas as técnicas, mas também novos conceitos. Assim, por exemplo, as atividades agropecuárias estão cada vez mais orientadas pelo crescente interesse por métodos brandos de intervenção na natureza e pelas preocupações com a saúde e o bem-estar do consumidor. Mas os produtos alimentares, além de saudáveis, devem proporcionar prazer na alimentação. Não é por outro motivo que a realidade sepultou o sonho futurista de um escritor norte-americano, apresentado na década de 1930: a pílula de alimento concentrado. Na época, o ficcionista imaginou que, cinquenta anos mais tarde, o estrupício em forma de pílula poderia estar alimentando os habitantes de Nova York. Ou seja, a tecnologia tem limites e nós poderemos oferecer de tudo, menos a tal pílula. Essa não é para a boca do homem. Continuará em falta.

Mas um problema nos preocupa: atualmente, grande parte dos brasileiros mora em cidades, sendo que muitos milhões estão nas capitais. A maioria desconhece o que se passa no campo, longe da área urbana. Ninguém pensa, por exemplo, que os automóveis estão rodando sobre pneus porque alguém planta seringueiras; nem que as calças jeans não existiriam sem algodão; nem bolsas, cintos e carteiras sem a criação de bois; nem haveria móveis, construções e papel sem a existência de árvores; ou roupa íntima e gravatas sem a plantação de amoreiras que alimentam as lagartas do bicho da seda. Há uma ideia geral de que a agricultura serve para produzir comidas apenas. Falso, inteiramente falso!

Um exemplo fascinante é a cerveja: sem produtores de cevada não haveria cerveja. Nem fábricas de cerveja e os empregos nelas existentes; nem fábricas de garrafas de cervejas, rótulos, tampinhas ou latinhas, nem de caixas para embalar latas ou garrafas; de caminhões para transportá-las, de geladeiras para refrigera-las. Não haveria fábricas de copos para tomar cerveja, de mesas e cadeiras de bares. Não haveria costureiras fazendo uniformes de garçons.

Este conjunto de atividades, a cadeia produtiva da cerveja, o agribusiness da cerveja, é que precisa ser compreendido: sem o produtor de cevada, nenhum emprego dos demais elos da cadeia existiria: é, pois, a agricultura, o início do processo. Isto é agribusiness, um conceito introduzido em Harvard em 1957 por estudiosos liderados por Ray Goldberg, e que se divide em antes da porteira (insumos), dentro da porteira (a produção rural), depois da porteira (transporte, armazenagem, industrialização e comércio). Em todos os três capítulos, entram serviços financeiros, tecnologia etc.

Discute-se muito uma tradução para agribusiness, e várias propostas já surgiram: agronegócio, complexo agroindustrial, sistema agroindustrial e outras. O que importa é o conceito – e o termo está bem aceito no mundo todo e este mostra que o nosso agribusiness é o maior negócio do Brasil: vale 25% do total da produção nacional, gera 37% de todos os empregos e responde por 40% das exportações, sendo o único setor superavitário, responsável mesmo pela salvação de nossa balança comercial. E ainda mais: o produtor rural brasileiro, seja ele agricultor, seja pecuarista, seja reflorestador, é um preservacionista nato.

Ele sabe que precisa conservar seu solo para garantir a fertilidade futura das terras e, por conseguinte, a continuidade da sua atividade produtiva. Depois de um período passado em que a questão ambiental era pouco considerada em geral, hoje é no campo que estão as mais modernas tecnologias preservacionistas. O que é complicado, porque, após a trágica mentira de Pero Vaz de Caminha (“nesta terra, em se plantando, tudo dá”), foi preciso entender que a maioria dos solos brasileiros demandam correção, fertilizantes e muito investimento para serem produtivos. E toda a tecnologia para isto foi gerado por dedicados pesquisadores brasileiros, difundida por heroicos extencionistas e aplicada por este exército pela paz dos anônimos produtores rurais de todos os rincões do Brasil”.

“Capítulo 6: a) Pontos de Apoio– Há cerca de 10.000 anos, o homem começou a domesticar animais e plantas. Foi uma reviravolta em suas relações com o ambiente, pois libertou-o das incertezas da vida nômade, dependente dos alimentos obtidos por meio da caça, da pesca e da coleta. As técnicas agropecuárias sofreram desenvolvimento constante. No princípio a evolução foi lenta, acelerando-se a partir do século XVIII. Atualmente, a agropecuária se apoia nas máquinas e nos recursos da química e da biotecnologia para elevar de forma exponencial a produtividade da terra e do trabalho”. P. 109

Tratorb) Força Multiplicada – O primeiro trator foi construído, nos E.U.A. Era movido a gasolina. Hoje existem modelos e marcas em profusão, dotados de motores diesel e de um dispositivo hidráulico para levantar pesos e controlar a força enviada aos equipamentos que o trator reboca. São muitos: Arados, maquinas para semear, adubar, colher, enfardar, pulverizar, etc. Graças ao trator e à grande variedade de máquinas que podem ser acopladas a ele, a produtividade da mão de obra agrícola aumentou de forma exponencial.

Em termos de potência, pode-se dizer que um animal de tração equivale a dez homens, em média. Sendo assim, um trator com a potência de 50 cavalos-vapor poderia realizar o trabalho feito por 500 homens em determinado intervalo de tempo. Isso não acontece na prática. Primeiro porque é impossível transmitir toda a potência do trator à as máquinas que traciona. Depois, os implementos não conseguem transformar toda a potência recebida em trabalho útil. Mas, se for admitida como possível uma eficiência de 40% do sistema trator e implemento, a máquina de 50 cv realizaria trabalho útil com 20 cv, suficientes para substituir 200 homens. Embora esse número ainda pareça exagerado, é fato inquestionável que o trator substitui muitos homens no trabalho rural. Por exemplo: Para capinar uma lavoura de café, um operador de trator faz num dia o serviço de cerca de 50 trabalhadores braçais, conforme dados de pesquisa realizada no campo.

colheitadeiras

Depois dos tratores, as outras máquinas de grande porte que chamam a atenção no campo são as colhedoras. Dessas também existem muitas máquinas e modelo para a colheita de grãos – como soja, milho, trigo, arroz, etc. A cana de açúcar e algodão para ficar apenas com os exemplos de colhedoras mais comuns no Brasil. Essas máquinas entram em campo e engolem plantas inteiras, dispostas em linha, separando os grãos do estante da massa vegetal. A palha é devolvida ao chão, em quanto o produto da colheita é armazenado no bojo da máquina, com baixo teor de impurezas. As colhedoras são bastante complexas – várias máquinas numa só, verdadeiras unidades ambulantes de beneficiamento.

Com elas, a mecanização da agricultura chegou a um grau extraordinário de eficiência, sofisticação e conforto: Adão morreria de inveja dos operadores, de quem as cabinas climatizadas eliminaram o suor do rosto. Afinal, essas cabinas foram aperfeiçoadas para dar conforto aos fazendeiros do Primeiro Mundo – homens e mulheres que, mesmo sendo de países ricos, estão acostumados a pegar no batente, com mãos ásperas. Lá, como aqui, as colhedoras podem rodar dia e noite. E tratar quantidades prodigiosas de material vegetal, enquanto devoram, às vezes, centenas de postos de trabalho. P. 116

c) Fertilizantes – Ração para as plantas. Os biólogos ensinam que as formigas foram os primeiros seres do planeta a praticar a agricultura e a criação de outros bichos. De fato, várias espécies de formigas vêm cultivando fungos nos últimos 50 milhões de anos. Algumas criam pulgões. Recentemente, a ciência descobriu que determinadas cultivadoras de fungos costumam defender suas “hortas” contra organismos invasores. Para isso, usam antibióticos herbicidas, que elas mesmas produzem, em glândulas especiais. As formigas também fertilizam as “plantações” com folhas misturadas a excrementos. O homem não aprendeu as técnicas desses insetos. Mas seguiu uma trajetória semelhante. Observou, há muito tempo, que os solos explorados de forma permanente tendem a perder a fertilidade. Ou seja, com maior ou menor velocidade, deixam de dar sustentação às lavouras ou à produção de alimentos para os animais.

Para que isso não aconteça, convém adotar práticas conservacionistas e devolver nutrientes à terra. Isso se faz com os adubos ou fertilizantes, substâncias que contêm elementos essenciais ao desenvolvimento das plantas. O homem verificou que seus excrementos e os de outros animais são bons fertilizantes. Assim como a cinza vegetal, a turfa, e o lodo de rios, lagos e pântanos. Vários desses adubos foram os primeiros a ser utilizados, conforme narram, por exemplo, escritores greco-romanos, que deram notícias do emprego da mistura de fezes humanas e de animais com a palha e restos de culturas, além de outros vegetais e refugos.

Plínio, o Velho, a maior autoridade científica da Europa antiga, que viveu no século I d.C., realizou pesquisas sobre o uso de legumes e outras plantas misturadas ao solo para enriquecê-lo. Analisou também o valor das cinzas como fertilizantes. Embora jamais tenha sabido, as cinzas são ricas em potássios um dos mais importantes nutrientes minerais para as plantas. Os outros dois são o nitrogênio e fósforo. Cada um deles tem um papel inicial na vida dos vegetais. Sem potássio, não à formação de flores nem frutos. O nitrogênio é fundamental para o crescimento, o fósforo é importante nos desenvolvimentos das raízes. As plantas necessitam ainda em quantidades menores, de outras 10 nutrientes minerais. Se houver escassez desses elementos químicos no solo, elas podem crescer enfezadas, apresentar machas e não dar frutos, por exemplo”. P. 118

d) Sementes- No princípio, trigo e cevada. Depois de descobrir o fogo, o homem demorou uns bons 500.000 anos para levar alimentos diferentes de carne e ossos até o braseiro, com regularidade. Isso começou a acontecer há cerca de 10.000 anos. Talvez um pouco mais. É o que sugere a pesquisa arqueológica, baseada em métodos modernos de datação. Naqueles tempos, apenas a natureza plantava. O homem se encarregava de colher, usando lâminas de sílex. Tinha concorrentes na safra. Pássaros e outros animais. Os novos mantimentos, trigo e cevada, coletados a esmo, apresentavam características bem diferentes das variedades de hoje.

Os grãos eram pequeninos, escassos e se ligavam fracamente às espigas. Costumavam cair, à medida que amadureciam, em conformidade com os projetos da natureza, interessada na dispersão das sementes. De acordo com esse padrão, as gramíneas cresciam esparramadas pelos campos, de forma aleatória. Contudo, após a descoberta dos grãos, a importância das sementes na geração de novas plantas deve ter sido percebida ainda cedo. E o homem, sabemos todos, não é conformista. Portanto, logo deve ter iniciado as primeiras experiências de cultivo. Mesmo assim, pode-se imaginar que as searas primitivas diferiam da “produção” natural somente na densidade do plantio, o número de pés cultivado por unidade de área. Porque as plantas deviam ser muito desiguais entre si em termos de vigor, altura, produtividade e maturidade.

Mas, conhecendo a ligação entre semente e vegetal, o homem passou a guardar para cultivo os grãos que lhe pareciam mais promissores e bonitos. Nascia, assim, praticamente junto com a agricultura, a técnica de melhoramento de plantas. A domesticação levou a espécimes capazes de produzir grãos maiores, que amadureciam e germinavam com regularidade e em pouco tempo. Guardadas as devidas proporções, pode-se considerar rápida a passagem do homem primitivo da fase de simples coleta de cereais para o cultivo de grãos. A pesquisa arqueológica já provou isso, ao desencovar sementes de trigo e cevada, sepultadas há 9.000 anos no Oriente próximo, junto com ossos de cabras.

A prática da agricultura foi uma revolução fundamental para a espécie humana. Caso ela não ocorresse, seria improvável que as áreas de caça pudessem sustentar grande número de pessoas. Na verdade, todas as civilizações antigas, das quais se conhecem as dietas, tinham como base alimentar plantas que se reproduziam por sementes. Trigo, milho, arroz. Alguns daqueles povos cuidavam de rebanhos. Outros não. E a agricultura surgiu de forma independente em várias regiões da Terra. No México, por exemplo, foram achados restos de cabaças, abóboras, feijões e pimentas datados entre 7.000 e 5.000 a.C., O cultivo de milho foi iniciado a 7.000 anos.

Com certeza, houve muitas surpresas pelo caminho. Algumas foram boas. Por exemplo: no princípio da grande revolução agrícola, a aveia e o centeio eram consideradas ervas invasoras dos campos de trigo e cevada. E, como tal, acompanharam as plantas domesticadas para outras terras. Quando chegaram ao norte da Europa, a aveia e o centeio mostraram capacidade de se desenvolver tanto ou mais que o trigo e a cevada. Com o tempo, passaram pelo processo de melhoramento e terminaram cultivados em larga escala.

Muitas outras espécies vegetais foram selecionadas, ao longo da História, por meio de cruzamentos. Esse método, chamado também de hibridação, permaneceu durante séculos como a única técnica disponível para juntar as características desejáveis de várias plantas, ou de uma sucessão delas. Os acertos na hibridação dependeram das qualidades naturais das plantas e da habilidade dos agricultores de diversos quadrantes do Globo. O melhoramento, assim, era uma arte. Esse caráter seria perdido a partir da segunda metade do século XIX, quando os melhoradores passaram a se orientar pelas descobertas realizadas em vários ramos da ciência: fisiologia, estatística, agronomia, botânica e genética.

O avanço prosseguiu acelerado no século XX. Vários métodos e processos foram incorporados ao melhoramento genético, contribuído para encurtar o tempo na obtenção de novas variedades, com características específicas. Entre 1940 e 1970, isso ocorreu com a aplicação de tratamentos químicos e físicos, empregados para induzir mutações genéticas. Em seguida, o panorama começou a mudar de forma radical, em consequência do desenvolvimento da biotecnologia, que entra no século XXI com os chamados produtos transgênicos, ou organismos geneticamente modificados. Esses organismos, por meio de manipulação em laboratórios, incorporam genes de outros seres vivos, que lhes dão características desejadas pelos melhoradores. Mas as novas técnicas da biotecnologia não são exclusivas de quem trabalha com plantas. Estão sendo empregadas em pesquisas em diversos campos da ciência.

Os resultados alcançados pelos melhoramentos têm sido impressionantes. Um exemplo notável das proezas da bioengenharia foi a invenção do milho Bt, nos EUA. Esse milho contém um gene de bactéria – o Bacillus thuringienses, que produz uma substância tóxica em suas folhas. Para matar lagartas que têm o costume de esburacar folhas da planta. Semelhante mistura de genes e seus efeitos seriam inimagináveis há poucas décadas. Nos anos 2000, havia cerca de 40 milhões de hectares cultivados com plantas transgênicas em todo o planeta. As principais culturas eram as de soja, milho, algodão, canola e batata.

Transgênicas ou não, as sementes selecionadas têm sido um dos pilares da agricultura, responsáveis pela imensa quantidade de grãos e fibras colocadas todos os anos no mercado. Estima-se que o Brasil tenha investido cerca de US$ 20 bilhões em pesquisa de sementes nos últimos 30 anos. A preocupação com a qualidade desse insumo básico vem de longa data. A Alemanha fundou o primeiro laboratório de análise de sementes em 1869. Nos EUA, em 1908, surgiu a AOSA – Associação Oficial de Analistas de Sementes, que iniciou a regulamentação do comércio desses produtos no país e no Canadá”. P. 123 a 125 do livro citado.

“Capítulo 7: Máquinas e Insumos (P. 139) – Troca de guarda. Pouco antes de começar o ciclo da soja, o Brasil inaugurava sua indústria de tratores. Foi durante o governo de Juscelino Kubitschek, na mesma época da construção das fábricas de automóveis e de Brasília. Os primeiros tratores de rodas deixaram as linhas de montagem em 1960. Foram apenas 37 naquele ano, que se juntaram à frota nacional, que contava com cerca de 63.000 unidades, montadas no estrangeiro, é claro. O crescimento da frota foi considerável em relação a 1950.

Mas, como as importações haviam sido realizadas sem muito critério, a legião estrangeira aportada aqui reunia em suas fileiras mais de uma centena de marcas, roncando em diversas línguas. Essa babel mecanizada desapareceria aos poucos, à medida que o grupo de indústria estabelecidas no país providenciava a troca de guarda com seus equipamentos, já protegidos por barreiras alfandegárias e escoados a poder de crédito fácil e barato.

Foi um período inesquecível para a indústria. Ela pôde comemorar um recorde histórico em 1976, quando a produção totalizou 82.632 máquinas agrícolas, as quais 64.175 tratores de rodas. As colhedoras de grãos, tratores de esteiras e microtratores completam as estatísticas. Já a partir de 1977, com profundos altos e baixos, como numa montanha-russa, a produção de máquinas agrícola começou a minguar, ficando um pouco acima de 30 mil unidades nos últimos anos do século XX.

A indústria, porém, estava dirigindo boa parte da produção para o mercado externo. Assim, descontadas as exportações, os resultados anuais das vendas no mercado interno ficaram um pouco acima de 20 mil máquinas, em média. Mesmo com as exportações, os dados mostram que as montadoras andavam puxando o peso desconfortável de grande capacidade ociosa. O desconforto era maior ainda entre os produtores rurais, pois capacidade de produção sobrando significa custos e preços mais altos para o produtor final.

Embrulhada econômica – Desde que o crédito barato e outras facilidades governamentais para a agropecuária foram desaparecendo ao longo dos anos de 1980, os clientes começaram a relutar na hora de comprar máquinas novas. Havia sólidas razões para tanto: quando se acabaram os tempos de bonança, grande parte dos produtores rurais terminou engrossando o formidável exército de brasileiros habituado a comer o pão que o diabo amassou. Foram várias crises nos últimos decênios que, a rigor, pouco ou nada resolveram.

O campo aprendeu a viver perigosamente: endividado e em equilíbrio instável. Nessas circunstâncias, não é de admirar que a frota nacional de máquinas agrícolas encolhesse. A indústria estima que o Brasil chegou a ter 551 mil tratores de rodas em 1985. Foi o pico. Em 1998, haveria apenas 460 mil máquinas. O equivalente a pouco menos de 10% da frota norte-americana, formada por 4.8 milhões de tratores. A estimativa é apenas razoável, porque, em suas contas, os fabricantes atribuem vida útil de dez anos aos tratores ou dez mil horas de uso.

Mas no Brasil, eles costumam viver bem mais. Por isso, ao encerrar-se o século XX, o parque brasileiro de tratores poderia ser um pouco maior do que calculam as montadoras. Tal constatação não serve de consolo para ninguém: equipamentos velhos têm custo de manutenção muito alto e, mesmo assim, não rendem o que seria desejável.

O fato é que os donos de máquinas velhas, produtores sem muitos recursos, mas aferrados a seu mundo, contam com a solidariedade de mecânicos competentes e tão teimosos quantos eles para mantê-las funcionando. Assim, ao contrário de 1950, ao iniciar-se o Terceiro Milênio ficou bem fácil achar tratores no Brasil. Porém, boa parte da frota não pode esconder as marcas da idade. Velhos ou novos, contudo, os tratores em uso têm puxado e acionado grande quantidade de outras máquinas e implementos agrícolas, destinados ao preparo do solo, adubação, semeadura e várias outras operações importantes no campo.

Não poderia ser diferente, por se tratar de uma agricultura que reza pela cartilha da revolução verde. O país, em poucas décadas, virou um grande mercado para as indústrias de adubos e demais produtos químicos usados nas lavouras. Em 1991, as vendas de inseticidas, herbicidas e outros produtos, chamados de defensivos agrícolas, somaram 988 milhões de dólares. No ano 2.000, o faturamento desse ramo da indústria havia saltado para 2,5 bilhões de dólares, apresentando expansão de 153% no período. Também a partir de 1991, as vendas de fertilizantes mostraram crescimento nada desprezível de 105%, passando, de 8,57 milhões de toneladas, para 17,54 milhões de toneladas em 2.000. ”

Nota- Completamos assim seis números na reprodução, com transcrição de aproximadamente 10% das 226 páginas da importante obra “A História do Agribusiness Brasileiro”, texto de Rogério Furtado, Editora Evoluir Cultural, da ABAG. Livro instrutivo que na realidade é a história de nossa agricultura, contada num estilo pitoresco e sintetizada de uma maneira resumida e comparativa, que analisa e descreve a evolução do Brasil rural desde sua descoberta até o presente ano de 2002. Obra que merece ser adquirida para estudo e consulta dos que se interessam por conhecer a realidade econômica do país, ao longo destes 500 anos.

Eng Agr Ruy Gripp

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